Fantasma de 2014 ronda a seleção

A seleção brasileira corre o risco de tropeçar mais uma vez em suas emoções, como aconteceu em 2014. Naquela Copa, a incapacidade de administrar a pressão de jogar em casa e a de jogar abaixo da expectativa levou a equipe a travar na semifinal, levando de 7 a 1 da Alemanha, o maior vexame da história da seleção. Desta vez, o país é outro, como também são a comissão técnica e a maioria dos jogadores. Mas muitos dos jogadores mais importantes de 2014 estão nesta disputa.

E probema parece vir justamente dali.

As cenas de choro de Neymar no final da partida contra a Costa Rica e o desabafo de Thiago Silva na saída do campo indicam que o controle das emoções é novamente um problema.

Desde a sexta-feira, os dois eventos continuam repercutindo também no noticiário internacional e suscitaram críticas de ex-jogadores de ao menos cinco países.

No caso de Neymar, a questão não foi só que ele caiu em lágrimas após uma vitória num jogo de primeira fase –se a pressão em jogos iniciais já o deixa nesse estado, como será quando o bicho pegar pra valer? O ponto talvez mais importante é que ele não aguentou até chegar ao vestiário, onde pudesse extravasar com privacidade.

As cenas do camisa 10 brasileiro com os nervos em frangalhos são uma informação útil para cada próximo adversário. E é certo é que eles vão explorar isso. Faz parte do futebol.

O caso de Thiago Silva foi ainda mais grave, e não só porque não foi a primeira vez. Na última Copa, em 2014, já capitão, o zagueiro não só chorou na decisão por pênaltis contra o Chile, como implorou para não ter de bater. Pior, também naquela oportunidade, contou tudo isso na entrevista pós-jogo.

Nesta Copa, a cena se repetiu. Ele contou na entrevista que ficou “muito triste” por ter sido xingado por Neymar por devolver uma bola ao adversário. O zagueiro ainda quis se valorizar dizendo que tinha compreendido a situação, mas o efeito disso foi zero, naturalmente.

Já é suficientemente desapontador saber que um jogador que está em sua terceira Copa do Mundo, perto de fazer 34 anos, se sinta “muito triste” porque foi xingado por um colega de equipe no calor da partida. Mas é muito pior perceber que ele não é capaz de entender que DR de jogador se faz dentro do vestiário ou na concentração. E não em público.

O objetivo da seleção é ganhar a Copa. Expor os intestinos das relações entre os jogadores certamente não ajuda nisso.

Pode-se esperar quase tudo do capitão de uma equipe top mundial de esporte profissional, menos que ele coloque um divã na saída do campo e coloque um jornalista no papel de psicanalista.

A questão é sobre autocontrole e não em ser ou não ser machão ou insensível. Isso nada tem a ver com gênero. Alguém acha que Marta, a Pelé do futebol feminino, escolhia as palavras com as companheiras enquanto buscava uma medalha olímpica? E a dupla Paula e Hortência se xingou pouco até conseguir o ouro no Mundial de basquete?

Para quem não se convence disso, basta comparar com as outras seleções desta Copa e com as seleções brasileiras das outras Copas, em especial as vencedoras.

Neste Mundial, Messi está numa draga muito pior que Neymar. Mas, se chorou, foi no vestiário. Salah teve seu sonho transformado em pesadelo. E não se viu nenhum descontrole, dentro ou fora de campo.

Nas história das seleções brasileiras, basta lembrar de Dunga, capitão do tetra e de 1998. Se cada palavrão dele em campo fosse um tijolo, em cada estádio haveria uma muralha. E nenhum jogador foi chorar para os jornalistas. No vestiário é que as coisas se resolviam –não é assim em qualquer trabalho?

Quando a seleção é campeã, todas as ofensas são perdoadas. Quando uma seleção grande como o Brasil perde, fica aquele gosto horrível de poder ter feito mais. Se os jogadores não aprenderem a relevar o que é secundário, o caminho para o hexa será mais árduo.