Marcelo Damato https://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br A paixão, o dinheiro e o poder que envolvem a Copa. E um pouquinho de bola... Sun, 15 Jul 2018 17:25:28 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Agentes ameaçam processar Fifa contra limites em seus ganhos https://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br/2018/06/23/agentes-ameacam-processar-fifa-contra-limites-em-seus-ganhos/ https://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br/2018/06/23/agentes-ameacam-processar-fifa-contra-limites-em-seus-ganhos/#respond Sat, 23 Jun 2018 16:33:12 +0000 https://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br/files/2018/06/Mino-Raiola-agente-de-futebol-150x150.jpeg http://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br/?p=157 Durante a Copa da Rússia, a bola (quase) para no mundo, mas não a política da bola. Um grupo de super-agentes de futebol ameaça ir à Corte Européia de Justiça contra a Fifa, caso a entidade baixe uma legislação sobre transferências de atletas tal qual está programando.

O presidente da Fifa, Gianni Infantino, já anunciou que pretende combater o poder econômico dos grandes clubes e agentes, por meio da redução do número de transações e das comissões pagas.

Algumas das mudanças estudadas são o limite de quatro contratações na janela de inverno (mais duas por motivo de lesão grave) e verificação criminal das transferências de dinheiro.

A criação de um grupo para criar as regras foi anunciada em janeiro, após um estudo da Uefa mostrar que nas cinco temporadas até 2016-17 os agentes faturaram 2,5 bilhões de libras (cerca de R$ 12,6 bilhões) em negócios na Europa. O valor é 12% a mais que o orçamento do Manchester United, o clube mais rico do mundo, no mesmo período. Supera também os 20 clubes da Série A do Brasil somados.

Por causa disso, a Uefa determinou que os clubes devem publicar em detalhes os pagamentos de comissão. No Brasil, isso é opcional. Estima-se que menos de 10% dos pagamentos são declarados.

Quando atuam numa negociação, os agentes são remunerados de várias maneiras. As principais são a comissão de intermediação do negócio, recebida do clube vendedor, e a taxa sobre o contrato entre jogador e clube, descontada do atleta.

Em geral as relações entre agentes e jogadores são estáveis e entre clube e intermediário são realizadas caso a caso. Em cada esporte a taxa de intermediação é diferente, segundo sua própria tradição. Na NFL (futebol americano), a liga com a média salarial mais alta do mundo, a comissão é de 2%.

No futebol, ela é bem mais alta. Segundo o estudo, nas transações maiores, ela fica em 9%. Nas pequenas pode chegar a 40%. Na média, fica em 13%. A Fifa queria limitar essa taxa em 3%. Os agentes pressionaram, a proposta subiu para 5%, mas não houve acordo.

Do ponto de vista da representação de atletas, o mercado ainda é muito pulverizado. É muito raro, por exemplo, que um agente tenha mais do que 2 entre os 20 jogadores mais valorizados do mundo.

Quando negociam seus principais jogadores, os agentes podem receber duplamente. Um caso que gerou escândalo foi a comissão de 41 milhões de libras (R$ 206 milhões, pelo câmbio atual) recebida pelo agente italiano Mino Raiola pela transferência do meia Paul Pogba, da Juventus para o Manchester United, em 2016.

O valor dessa comissão equivale, grosso modo, ao orçamento do Fluminense em 2017.

A questão não é o dinheiro em si, mas o poder que ele agrega aos agentes, que são contra as principais mudanças.

O português Jorge Mendes, dono da Gestifute e agente de Cristiano Ronaldo e ex de Felipão, atua não só no mercado de jogadores, como no de clubes, em vários continentes. Para convencer empresários a vender –ou a comprar– clubes, Mendes atua tanto como um financiador, quanto como fornecedor de jogadores para os novos proprietários.

Com a qualidade dos atletas cada vez mais concentrada, o dinheiro do futebol se concentra também.

O reflexo dessa situação está na Copa do Mundo. A cada Mundial, há mais atletas atuando fora do país de origem e mais jogadores atuando por seleções estrangeiras (Na Rússia, 82 em 22 seleções). Como os países periféricos, perdem jogadores cada vez mais cedo, têm mais dificuldade para formar novas gerações e completam a seleção com atletas nascidos em países centrais. Na Copa há 50 nascidos na França, em seis seleções (21 na própria equipe).

Raiola, a Gestifute e o Stellar Group, de Londres, a trinca das maiores agências, têm se reunido com frequência entre si e com Infantino e já o avisaram que, se não forem mais ouvidos, irão à Justiça. A ver.

]]>
0
O capitão do Irã deve uma para a Fifa https://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br/2018/06/21/o-capitao-do-ira-deve-uma-para-a-fifa/ https://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br/2018/06/21/o-capitao-do-ira-deve-uma-para-a-fifa/#respond Thu, 21 Jun 2018 14:51:38 +0000 https://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br/files/2018/06/Masoud-capitão-do-Irã-agradece-a-torcida-após-vitória-sobre-Marrocos-Paul-Ellis-15.jun_.18-AFP-150x150.jpg http://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br/?p=135 O meia Masoud, capitão do Irã na Rússia, quase não pôde participar da Copa por motivos políticos e só foi confirmado também por pressão política –da Fifa.

Um dos maiores jogadores do Irã, Masoud, 34, é um dos poucos que atua fora de seu país. Desde os 22 atua no exterior, passando por clubes dos Emirados, Espanha, Qatar e Grécia (na próxima temporada, tem proposta para voltar à Espanha e Qatar).

Masoud participou de toda a campanha das eliminatórias. O Irã terminou invicto e foi a segunda equipe a garantir vaga para a Copa –só atrás do Brasil-, no dia 12 de junho do ano passado.

Cerca de 40 dias depois, o seu clube, o Panionios, da Grécia, teve um confronto marcado contra o Maccabi, de Tel Aviv, Israel, pela Liga Europa.

O governo de Teerã, que não tem relações diplomáticas com Israel desde logo depois da revolução de 1979 e já manifestou diversas vezes o desejo de que “o Pequeno Satã” despareça, proibiu a ele e ao zagueiro Haji Safi, seu colega de clube e seleção, de disputar a partida em Israel.

Ambos, por força de contrato, decidiram ignorar a proibição, e participaram do confronto –perderam os dois jogos por 1 a 0. Em seguida, foram oficialmente banidos da seleção e considerados traidores. Alguns dias depois, Haji Safi fez um pedido público de desculpas e foi perdoado pelo governo e reintegrado.

Masoud ficou calado e seguiu banido. Quatro meses depois, às vésperas do sorteio, a Fifa ameaçou a Federação Iraniana de tirá-la da Copa. O governo recuou e decidiu deixar a questão com o treinador Carlos Queiroz. Com o apoio do maior jogador da história do Irã, Ali Karimi, que, quando jogava era chamado de “Maradona da Ásia”, Queiroz reintegrou Masoud e deu-lhe a faixa de capitão.

Nem sempre a Fifa se comportou dessa maneira.

Em novembro de 1973, dois meses depois do golpe militar que provocou a morte do presidente eleito Salvador Allende e levou ao poder o general Augusto Pinochet, se realizou no Chile um dos jogos mais infames da história do futebol.

Chile e União Soviética disputavam um mata-mata por uma vaga na Copa de 1974, na Alemanha. O primeiro jogo havia sido em Moscou e terminara 0 a 0. O jogo de volta estava marcado para o estádio Nacional, em Santiago. Acontece que o local havia sido transformado pelo governo militar num campo de concentração, em que aconteciam torturas e mortes. O governo soviético exigiu a realização da partida em outro local. Pinochet negou as acusações.

A Fifa realizou uma pantomima de verificação, e o presidente da entidade, o inglês Stanley Rous, confirmou o local do jogo. A URSS se recusou a viajar. Num estádio lotado, com os prisioneiros colocados no subsolo, os jogadores do Chile foram a campo, trocaram passes –alguns em impedimento-, fizeram um gol, que foi validado pelo árbitro, e assim se classificaram.

A atitude de Rous foi um dos motivos que o levaram a perder a reeleição, para o brasileiro João Havelange, sete meses depois.

]]>
0
Na primeira Copa após operação do FBI, a moda na Fifa é… dinheiro https://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br/2018/06/13/na-primeira-copa-apos-operacao-do-fbi-a-moda-na-fifa-e-dinheiro/ https://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br/2018/06/13/na-primeira-copa-apos-operacao-do-fbi-a-moda-na-fifa-e-dinheiro/#respond Wed, 13 Jun 2018 22:52:10 +0000 https://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br/files/2018/06/Gianni-Infantino-Martin-Ruggiero-Associated-Press-12.abr_.2018-150x150.jpg http://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br/?p=12 Mal faz três anos que agentes do FBI, com respaldo da Polícia Judiciaria suíça, entraram no hotel Baur au Lac, em Zurique, e fizeram a maior prisão da história do futebol mundial. Naquele 27 de maio de 2015, sete dirigentes foram presos, incluindo José Maria Marin, que havia deixado a Presidência da CBF 41 dias antes.
 
O presidente da Fifa, Joseph Blatter, um baixote sem pescoço que lembra os duendes do banco Gringotts, da saga de Harry Potter, não foi preso, mas ficou enfraquecido e por fim afastado do cargo. Seu principal rival e ex-aliado, o então “boss” da Uefa Michel Platini, com seus cabelos despenteados e ternos amarrotados, caiu no mesmo dia, cerca de quatro meses depois da ação do FBI. Ao todo, mais de 20 pessoas foram condenadas nos EUA e mais uma dezena foi afastada da Fifa.
 
Quem assumiria o poder seria o secretário-geral da Uefa, Gianni Infantino, suíço, apesar do nome italiano. Tinha 45 anos, entre 7 e 20 anos a menos na posse do que seus três antecessores, que revezaram o cetro desde 1961. Foi braço-direito de Platini e recebeu seu apoio até não precisar mais dele.
 
Com ternos impecáveis, perfil quase esguio e cabeça raspada, Infantino chegou prometendo o de sempre: modernidade, honestidade, democracia e transparência –além de quadruplicar os repasses para as federações nacionais. Por isso, enquanto no COI, que passava por crise bem menor, a ordem foi reduzir custos em obras olímpicas, na Fifa, o gigantismo não só foi mantido, como turbinado.
 
Mal assumiu, Infantino já anunciou que queria uma Copa com 48 clubes. O formato, que deve começar em 2026, na Copa da América do Norte, sobe o número de jogos de 64 para 80 (+25%). Logo estádios, sedes, voos, diárias, refeições subirão quase na mesma taxa. São mais
gastos e… mais receitas para distribuir.
 
Infantino não ficou só nisso. Propôs uma Liga Mundial de Nações e reformatou o Mundial de Clubes. Diz que um misterioso fundo liderado pelo banco japonês SoftBank pagaria US$ 25 bilhões por dez anos de contrato. Só isso quase triplicaria a receita da Fifa –de US$ 5,7 bilhões no atual quadriênio– que já é o triplo de quatro ciclos atrás.
 
Seu estilo centralizador e seu apetite por dinheiro está assustando até mesmo antigos aliados. Alguns relembram a origem da sua família, o Sul da Itália, lar de três máfias.
 
Na última reunião da Fifa, a resistência interna freou seus planos. Mas as cobranças de suas promessas políticas não param. E no ano que vem precisará disputar a reeleição. Se vencer, pode em tese, ficar indefinidamente. Se Infantino deixar o cargo com a mesma idade de Havelange, 83, vai ficar até 2054. Com os mesmos métodos de hoje.
 
Por isso, nesta Copa, aproveite o futebol. A Fifa não mudou de estilo, só de estilista.

]]>
0