Marcelo Damato https://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br A paixão, o dinheiro e o poder que envolvem a Copa. E um pouquinho de bola... Sun, 15 Jul 2018 17:25:28 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Lula e Neymar consomem mais esforço do que devolvem ao país https://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br/2018/07/10/lula-e-neymar-consomem-o-brasil/ https://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br/2018/07/10/lula-e-neymar-consomem-o-brasil/#respond Tue, 10 Jul 2018 18:07:35 +0000 https://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br/files/2018/07/Torcedor-após-a-derrota-para-Bélgica-país-vive-dois-dramas-um-em-amarelo-e-outro-em-vermelho-Benjamin-Cremel-6.jul_.18-AFP-150x150.jpg http://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br/?p=385 Em química, as reações entre os compostos podem ser divididas em exotérmicas, que liberam mais energia do que consomem, e endotérmicas, que agem ao contrário.

No trabalho e nas relações humanas, é parecido. Ao contratar um profissional, uma empresa ou entidade projeta que a riqueza gerada por seu trabalho supere o seu custo. Numa relação pessoal, seja um companheiro de cerveja, seja a pessoa com quem casamos, esperamos que o esforço gasto na relação seja recompensado com algo melhor.

Mas esse ganho não tem acontecido nem com Lula, nem com Neymar. Ambos consomem mais energia, esforço e emoções do que devolvem ao país. Neymar já encerrou sua campanha na Copa –com fracasso. Lula ainda está em campanha –para entrar na campanha eleitoral.

A premissa que move o apoio a ambos é a mesma: é a única pessoa que pode levar a um ápice, um objetivo essencial para a felicidade.

Para a esquerda que o apoia, Lula é o único capaz de, nas próximas eleições, derrotar “a direita”, esse grupo meio misterioso que iria de Temer a Bolsonaro, e que agiria com o objetivo de retirar direitos e dinheiro dos cidadãos, destruir a natureza e aumentar a exclusão.

Da mesma forma, Neymar era, para os seus fãs, o único craque capaz derrotar a Fifa, o VAR e todas as seleções e conquistar o sonhado hexa.

Para apoiá-los, é preciso quebrar a disciplina do Judiciário ou a disciplina da seleção. É preciso aceitar sem contestar o que fazem ou pedem, de um corte de cabelo lamen na véspera da estreia ou um frigobar na cela uma semana após a prisão.

Se você critica Neymar, independente de quantos elogios faça, então você é um cego, que não entende de futebol ou, pior, um invejoso que não aceita que um garoto pobre tenha sucesso –não importando quantos outros você admire– e até está torcendo contra. Ou seja, é um traidor da pátria.

Se você faz críticas a Lula, não importam os seus elogios, então você é um cego, que não enxerga a situação do país, ou, pior, um reacionário que não aceita que um ex-operário seja presidente do Brasil –ainda que já tenha votado nele. Ou seja, …

Para atender Lula em suas vontades, os seus fiéis se tornaram motivo de chacota nacional. Para atender Neymar em suas vontades, os seus fiéis, inclusive parte da comissão técnica, se tornaram motivo de chacota internacional.

Se as notícias sobre as recentes manobras no Judiciário fossem relativas a um político rival, os fãs de Lula ficariam revoltados. Já ficaram, com Aécio fazendo menos. Se as imagens, simulando, rolando e se contorcendo fosse de um jogador rival, os fãs de Neymar ficariam indignados. Já ficaram, com ingleses fazendo menos.

Pode-se dizer que Neymar é o Lula do futebol. E Lula é o Neymar da política.

A Bélgica e Bolsonaro agradecem.

 

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Após escândalo e com novo presidente, Fifa caminha para o Oriente https://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br/2018/06/21/apos-escandalo-e-com-novo-presidente-fifa-caminha-para-o-oriente/ https://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br/2018/06/21/apos-escandalo-e-com-novo-presidente-fifa-caminha-para-o-oriente/#respond Thu, 21 Jun 2018 23:07:17 +0000 https://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br/files/2018/06/Gianni-Infantino-esq-e-o-presidente-russo-Vladimir-Putin-Hassan-Ammar-14.jun_.18-Associated-Press-150x150.jpg http://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br/?p=137 O elenco de patrocinadores da Copa da Rússia mostra como a combinação da geopolítica mundial com o chamado Fifagate afastou empresas dos países do antigo “bloco ocidental” (EUA, União Européia, Canadá e Japão, especialmente) da entidade máxima do futebol. E fez a Fifa buscar novos rumos.

Várias empresas ligadas ao Ocidente ou aliados, como Emirados Árabes, saíram. Em seus lugares entraram corporações da Rússia e China e de países com interesses regionais, como o Qatar.

Grande parte das novas empresas estão ligadas apenas a esta Copa, mas algumas são “Fifa Partners”, a categoria top de patrocínio, que se aplica a todas as competições.

Pelos dados da entidade, até 2014 nunca um Fifa Partner havia deixado de renovar contrato. Desta vez, porém, dois saíram: Sony (Japão) e Emirates Airlines (Emirados Árabes). Em seus lugares, entraram Wanda (hotéis e cinemas, China), Gazprom (petróleo, Rússia) e Qatar Airlines. Como a Fifa criara duas vagas, uma ficou vazia.

As que permanecem são Coca-Cola (EUA, parceira desde 1982), Adidas (Alemanha, 1998), Hyundai (Coréia do Sul, 2002) e Visa (EUA, 2010).

Na categoria de patrocinadores da Copa, criada em 2010 (seis slots) e ampliada em 2014 (oito), a mudança foi quase completa. Saíram seis empresas como Castrol (lubrificantes, Reino Unido), Continental (pneus, Alemanha) e Johnson & Johnson (farmacêuticos e higiene, EUA) e entraram só três: Hisensi (TVs), Mengniu (laticínios) e Vivo (celulares), todas chinesas.

Só o McDonald’s (EUA) e a Budweiser (marca americana da belga AB InBev) continuaram.

A mudança de perfil tem duas causas. Com o Fifagate, alguns patrocinadores se afastaram alegando questões éticas. O segundo é a escolha, ainda em 2011, das sedes de duas Copas (Rússia-18 e Qatar-22) em países com problemas nas relações diplomáticas com o Ocidente e aliados.

A Rússia, mesmo após a queda do comunismo, nunca deixou de ser o alvo prioritário da Otan, a organização militar entre EUA e Europa. Em março, o atentado contra um ex-espião russo e sua filha em território britânico, levou o governo de Theresa May a retaliar a Rússia, com o apoio dos aliados. Antes disso, a Rússia não era bem vista pela Europa ocidental. Tanto que de nenhum país do continente partiram muitos torcedores –todos menos até que o Brasil.

O Qatar, por outro lado, busca aumentar sua influência no Oriente Médio, desafiando a liderança da Arábia Saudita, tradicional aliada dos EUA. Em junho, a Arábia Saudita, Egito, Emirados Árabes e Bahrein romperam relações diplomáticas com o Qatar, acusando-o de financiar o terrorismo –alguns desses países, como a Arábia Saudita, também são acusados da mesma coisa por analistas internacionais.

A China, segunda maior economia mundial, e que tenta ocupar espaços abertos pelas práticas protecionistas do presidente dos EUA, Donald Trump, tem no futebol uma das suas prioridades da diplomacia de negócios, o chamado soft power. O Qatar já faz isso há mais tempo, e a Rússia deve seguir os mesmos passos.

Ao mesmo tempo, a Fifa fragilizada pela operação do FBI e pela queda de patrocínios na Copa de 2018, encontra dificuldades não só para estancar seu déficit corrente como para cumprir a promessa eleitoral do presidente Gianni Infantino de quadruplicar os repasses para as federações nacionais.

Por isso, não deve ser surpresa se Infantino começar a se encontrar cada vez mais com políticos de países que nunca fizeram parte do centro do futebol mundial. O cartola sabe que o mundo do futebol é um excelente ambiente para diplomacia e negócios e vai usar isso para consolidar seu poder na Fifa.

 

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O capitão do Irã deve uma para a Fifa https://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br/2018/06/21/o-capitao-do-ira-deve-uma-para-a-fifa/ https://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br/2018/06/21/o-capitao-do-ira-deve-uma-para-a-fifa/#respond Thu, 21 Jun 2018 14:51:38 +0000 https://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br/files/2018/06/Masoud-capitão-do-Irã-agradece-a-torcida-após-vitória-sobre-Marrocos-Paul-Ellis-15.jun_.18-AFP-150x150.jpg http://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br/?p=135 O meia Masoud, capitão do Irã na Rússia, quase não pôde participar da Copa por motivos políticos e só foi confirmado também por pressão política –da Fifa.

Um dos maiores jogadores do Irã, Masoud, 34, é um dos poucos que atua fora de seu país. Desde os 22 atua no exterior, passando por clubes dos Emirados, Espanha, Qatar e Grécia (na próxima temporada, tem proposta para voltar à Espanha e Qatar).

Masoud participou de toda a campanha das eliminatórias. O Irã terminou invicto e foi a segunda equipe a garantir vaga para a Copa –só atrás do Brasil-, no dia 12 de junho do ano passado.

Cerca de 40 dias depois, o seu clube, o Panionios, da Grécia, teve um confronto marcado contra o Maccabi, de Tel Aviv, Israel, pela Liga Europa.

O governo de Teerã, que não tem relações diplomáticas com Israel desde logo depois da revolução de 1979 e já manifestou diversas vezes o desejo de que “o Pequeno Satã” despareça, proibiu a ele e ao zagueiro Haji Safi, seu colega de clube e seleção, de disputar a partida em Israel.

Ambos, por força de contrato, decidiram ignorar a proibição, e participaram do confronto –perderam os dois jogos por 1 a 0. Em seguida, foram oficialmente banidos da seleção e considerados traidores. Alguns dias depois, Haji Safi fez um pedido público de desculpas e foi perdoado pelo governo e reintegrado.

Masoud ficou calado e seguiu banido. Quatro meses depois, às vésperas do sorteio, a Fifa ameaçou a Federação Iraniana de tirá-la da Copa. O governo recuou e decidiu deixar a questão com o treinador Carlos Queiroz. Com o apoio do maior jogador da história do Irã, Ali Karimi, que, quando jogava era chamado de “Maradona da Ásia”, Queiroz reintegrou Masoud e deu-lhe a faixa de capitão.

Nem sempre a Fifa se comportou dessa maneira.

Em novembro de 1973, dois meses depois do golpe militar que provocou a morte do presidente eleito Salvador Allende e levou ao poder o general Augusto Pinochet, se realizou no Chile um dos jogos mais infames da história do futebol.

Chile e União Soviética disputavam um mata-mata por uma vaga na Copa de 1974, na Alemanha. O primeiro jogo havia sido em Moscou e terminara 0 a 0. O jogo de volta estava marcado para o estádio Nacional, em Santiago. Acontece que o local havia sido transformado pelo governo militar num campo de concentração, em que aconteciam torturas e mortes. O governo soviético exigiu a realização da partida em outro local. Pinochet negou as acusações.

A Fifa realizou uma pantomima de verificação, e o presidente da entidade, o inglês Stanley Rous, confirmou o local do jogo. A URSS se recusou a viajar. Num estádio lotado, com os prisioneiros colocados no subsolo, os jogadores do Chile foram a campo, trocaram passes –alguns em impedimento-, fizeram um gol, que foi validado pelo árbitro, e assim se classificaram.

A atitude de Rous foi um dos motivos que o levaram a perder a reeleição, para o brasileiro João Havelange, sete meses depois.

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Gol da Suíça expõe queda do poder da CBF dentro da Fifa https://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br/2018/06/18/gol-da-suica-expoe-queda-do-poder-da-cbf-dentro-da-fifa/ https://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br/2018/06/18/gol-da-suica-expoe-queda-do-poder-da-cbf-dentro-da-fifa/#respond Mon, 18 Jun 2018 12:01:14 +0000 https://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br/files/2018/06/Zuber-faz-o-gol-da-Suíça-contra-o-Brasil-Marko-Djurica-17.jun_.18-Reuters-150x150.jpg http://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br/?p=77 A polêmica surgida em relação ao lance que gerou o gol da Suíça deixou claro um ponto: o Brasil nunca esteve tão órfão dentro da Fifa, ao menos nos últimos 60 anos.

Desde que Ricardo Teixeira deixou a presidência da CBF, em 2012, o poder brasileiro dentro da entidade-mãe começou a cair. Depois da operação do FBI, em 27 de maio de 2015, que prendeu o ex-presidente José Maria Marin e deixou o então presidente Marco Polo Del Nero acorrentado ao Brasil, a queda se acentuou.

O recente episódio envolvendo o atual presidente, o coronel PM Antonio Nunes, na escolha da sede da Copa de 2026, rebaixou a CBF a uma entidade da periferia da bola na hierarquia política de Zurique. Para alguns virou quase um pária.

E quando acontece um problema como o deste domingo, o que fazer? Como pode reclamar a pessoa que quebrou um acordo e na última hora votou não só contra os interesses dos seus pares americanos, mas contra os da própria direção da Fifa? Como pode ser levada a sério uma pessoa que, ao justificar seu voto, parecia uma criança acuada? Como um dirigente que está sendo escondido por seus próprios subordinados na Rússia pode encaminhar uma reclamação?

E não há como pensar que isso não tem importância. Numa entidade com forte caráter político como a Fifa, todo naco de poder é importante. Como em qualquer atividade humana, a política tem peso no esporte.

Não é só por vaidade, diárias e passagens que as federações nacionais disputam todos os cargos em todas as comissões. Ricardo Teixeira nunca gostou muito de futebol, mas sempre ocupou um posto na comissão de arbitragem e por algum tempo foi seu vice-presidente.

O futebol é obviamente jogado e decidido pelos times e pelos jogadores. Menosprezar o papel de craques como Pelé, Garrincha, Romário e Ronaldo –só para falar de alguns brasileiros– é impossível. Quando não há situações-limite, só isso importa. Mas, com alguma frequência, há decisões difíceis. Os árbitros, em geral, tentam acertar sempre, mas não ignoram quais são as equipes politicamente mais fortes.

Não foi por coincidência que o Brasil ganhou as três primeiras Copas após a chegada à CBD (hoje CBF) de João Havelange, que em seguida viraria presidente da Fifa por 24 anos. Havelange não fez gol, mas não desgrudava dos poderosos, até se tornar o maior de todos –de todos os tempos.

De 1958 a 2014, foram muitos os episódios em que o Brasil foi beneficiado nos jogos e fora dele –Garrincha, o craque da Copa de 1962, só disputou a final graças a uma manobra na comissão disciplinar; em 1970, o local de uma semifinal foi mudado para atender a pedido do Brasil. Em sentido contrário, foram bem menos comuns.

A partir de 1989, esse poder se reforçou. Teixeira, que chegou à CBF como um ET, logo mostrou-se um disciplinado pupilo de Havelange. Colocava a si mesmo e a aliados brasileiros em todas as comissões que conseguia. Em 2002, em pelo menos dois jogos, os erros do árbitro beneficiaram a seleção. E não se está atribuindo as conquistas a isso, claro.

Depois de Teixeira, porém, a história mudou. É verdade que a ação do FBI, 41 dias após a posse de Marco Polo Del Nero, cortou a cadeia de passagem de poder do Brasil dentro da Fifa. De uma tacada só, Teixeira, Marin e Del Nero ficaram afastados da entidade.

Mas não há como negar que o comportamento de Marin e Del Nero foi a maior causa dessa queda. Na presidência de Marin, era Del Nero que tinha cargos na Fifa. Era mais conhecido pela idade e curvas das namoradas que levava do que pelo trabalho na entidade. O posterior sumiço dele, pelo medo de ser preso no exterior, prejudicou a CBF ainda mais.

E, para coroar, Del Nero inventou Nunes como seu sucessor temporário, apenas para impedir que um vice rebelde tomasse posse em caso de seu afastamento. E Nunes logo se revelou uma fonte quase infinita de constrangimento. E só tem piorado.

Agora, surge mais uma consequência previsível dessas decisões desastradas.

No código de honra dos jogadores, está não esperar por ajuda da arbitragem, mas ter a confiança de não serem prejudicados. Para que os brasileiros se preocupem apenas em jogar bola, eles precisam acreditar que suas costas estão protegidas.

Pela primeira vez em muitas Copas, isso pode não estar acontecendo.

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Se for campeã, seleção deve boicotar Temer? https://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br/2018/06/14/se-for-campea-selecao-deve-boicotar-temer/ https://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br/2018/06/14/se-for-campea-selecao-deve-boicotar-temer/#respond Thu, 14 Jun 2018 20:02:50 +0000 https://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br/files/2018/06/Michel-Temer-Ueslei-Marcelino-21.mai_.17-Reuters-150x150.jpeg http://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br/?p=19 Se for campeã mundial, a seleção brasileira terá mais uma decisão pela frente: aceitar ou recusar o tradicional convite presidencial para os campeões mundiais. Nada indica que o assunto esteja sendo discutido, mas não é uma questão menor.

A visita ao Palácio do Planalto tem dois aspectos. Por um lado, é -ou deveria ser- uma honra. O presidente representa todos os brasileiros. Por outro, é uma obrigação. O presidente é a pessoa mais poderosa do país. Dele se espera comportamento impecável e dele se teme o poder.

Por tudo isso, nunca os jogadores cogitaram recusar o convite. Juscelino Kubitschek (1958), João Goulart (1962), Emílio Médici (1970), Itamar Franco (1994) e Fernando Henrique Cardoso (2002) receberam os campeões mundiais no dia em que a seleção pousou com a taça –alguns foram visitados também antes da viagem.

Desta vez, é diferente. O fato de Temer não ter sido eleito não pega tanto. Afinal, Goulart e Itamar também eram vices – assumiram após as saídas de Jânio Quadros e Fernando Collor- e nem por isso foram esnobados. E Médici era general, escolhido por seus pares. Ter conspirado para derrubar a presidente Dilma Rousseff não pegou bem, mas esse ainda não é o ponto.

A questão é o que Temer se tornou. A rejeição ao seu governo é a maior já medida no Brasil (82% contra 3% de aprovação, pelo último Datafolha). Desde que foi flagrado em conversa com Joesley Batista, sua capacidade de governar desmoronou. Está sendo investigado por corrupção. E sua gestão da greve dos caminhoneiros destruiu o que tinha obtido na economia.

Assim, Temer virou um zumbi político, faminto por um pouco de popularidade. Quem pode foge dele -incluindo os colegas do MDB. Muitos analistas já disseram que Temer só não cai porque não há quem pôr em seu lugar. E porque as eleições estão chegando.

Para complicar, o mundo está mudando. Nos EUA, onde a reverência à imagem do presidente sempre foi enorme, a vontade de ir à Casa Branca caiu depois que Donald Trump passou a morar lá.

A ida de campeões à Casa Branca remonta a 1865. Nos anos 1980, os convites se tornaram regulares para os campeões da NFL e mais tarde para os da NBA. Mas, há um ano, após Trump mostrar atitude dúbia quanto a questões de racismo, a postura mudou. Os dois últimos campeões da NBA e o campeão da NFL foram desconvidados porque ameaçavam não ir. E os jogadores brasileiros certamente acompanharam esses episódios.

Mesmo a CBF, que sempre buscou estar de bem com o governo, pode calcular prós e contras a visita. Se o coronel Nunes recusasse -ainda que ninguém achasse que foi mais um engano dele, haveria pouco dano, pois Rogério Caboclo vai assumir em 2019, sob um novo ocupante do Planalto. Pela tradição, porém, o mais provável é que a cúpula da CBF é que lave as mãos.

Assim, os jogadores precisarão tomar a decisão sozinhos –ou com a comissão técnica. E, na falta de um Lebron James verde-e-amarelo, ninguém deverá falar nada até que tenham colocado a mão na taça.

Dada a magnitude da rejeição a Temer, uma banana para o presidente pode ser recebida pelos brasileiros quase como um bicampeonato em uma Copa só.

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No Mundial da Rússia, países estão em alta novamente https://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br/2018/06/14/no-mundial-da-russia-paises-estao-em-alta-novamente/ https://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br/2018/06/14/no-mundial-da-russia-paises-estao-em-alta-novamente/#respond Thu, 14 Jun 2018 13:36:47 +0000 https://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br/files/2018/06/Kin-Jon-un-e-Donald-Trump-Saul-Loeb-11.jun_.18-France-Presse-150x150.jpg http://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br/?p=31 Vamos combinar: Copa do Mundo tem um gosto de infância: todo mundo torcendo junto, álbum de figurinhas e… países. E não é que os países, que andavam meio desprezados, como aquele ap no Guarujá que ninguém mais quer ir, estão em alta novamente?

Na Copa da Alemanha, em 2006, se estava no auge da globalização. O tal do mundo plano. O euro havia sido introduzido havia poucos anos. Pessoas e capitais fluíam como nunca.

Em 2008, no futebol, a onda era o Barcelona de Guardiola. Muitos técnicos do exterior esculhambavam a Copa e alguns jornalistas do Brasil até pediam que ela fosse extinta, substituída por um Mundial de Clubes.

Mas aí veio a crise do subprime nos EUA, a integração dos mercados fez todo mundo despencar, menos o país da marolinha –a conta veio mais tarde. A Terra perdeu o rumo.

E desde a última Copa, a globalização, que era para ser um Fim-da-História 2.0, enroscou feio. Brexit, Crise da Catalunha, Trump, Kim, os mísseis de Putin, Guerra Civil na Síria, atentados do Estado Islâmico na Europa, crise nuclear do Pacífico Oriental, acordo-desacordo EUA-Cuba, Crise do Nafta… (e nós aqui, sempre com crises caseirinhas).

Até as empresas da nova tecnologia começaram a dar cabeçada: Facebook, Uber, AirBnB, Tesla…

O medo se instalou, e muita gente quis fechar a sua casinha. Criaram barreiras, muros até. O tal plano miou.

E agora todo mundo parece mais ligado em países. O nacionalismo aumentou.

Mas obviamente não é como foi antes –nunca é.

Quando eu era garoto, o álbum de figurinha era mais monótono. Nas seleções européias, só tinha brancos; nas latinas, morenos meio gordinhos; nas árabes, bigodudos; nas africanas sub-Saara, negros (a única que poderia ser misturada, estava banida por apartheid); e no Leste asiático todos tinham cabelo escovinha. Só o Brasil era misturado.

O mundo mudou –o Brasil, também aqui, bem menos-, e hoje França tem uma seleção quase negra, a Suíça tem poucos loiros, e o troca-troca de países é enorme. Nesta Copa, 22 seleções têm convocados nascidos em outros países. O único grupo “puro RG” é o F, de Alemanha, Coréia do Sul, México e Suécia.

No mundo dos países, a mobilidade das pessoas diminui (a do dinheiro, nem pensar, imagine), mas pelo menos a Copa fica mais legal.

Daqui a 32 dias -ou antes, se o Brasil perder ou os caminhoneiros pararem de novo- o nosso mundo volta ao normal.

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Na primeira Copa após operação do FBI, a moda na Fifa é… dinheiro https://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br/2018/06/13/na-primeira-copa-apos-operacao-do-fbi-a-moda-na-fifa-e-dinheiro/ https://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br/2018/06/13/na-primeira-copa-apos-operacao-do-fbi-a-moda-na-fifa-e-dinheiro/#respond Wed, 13 Jun 2018 22:52:10 +0000 https://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br/files/2018/06/Gianni-Infantino-Martin-Ruggiero-Associated-Press-12.abr_.2018-150x150.jpg http://marcelodamato.blogfolha.uol.com.br/?p=12 Mal faz três anos que agentes do FBI, com respaldo da Polícia Judiciaria suíça, entraram no hotel Baur au Lac, em Zurique, e fizeram a maior prisão da história do futebol mundial. Naquele 27 de maio de 2015, sete dirigentes foram presos, incluindo José Maria Marin, que havia deixado a Presidência da CBF 41 dias antes.
 
O presidente da Fifa, Joseph Blatter, um baixote sem pescoço que lembra os duendes do banco Gringotts, da saga de Harry Potter, não foi preso, mas ficou enfraquecido e por fim afastado do cargo. Seu principal rival e ex-aliado, o então “boss” da Uefa Michel Platini, com seus cabelos despenteados e ternos amarrotados, caiu no mesmo dia, cerca de quatro meses depois da ação do FBI. Ao todo, mais de 20 pessoas foram condenadas nos EUA e mais uma dezena foi afastada da Fifa.
 
Quem assumiria o poder seria o secretário-geral da Uefa, Gianni Infantino, suíço, apesar do nome italiano. Tinha 45 anos, entre 7 e 20 anos a menos na posse do que seus três antecessores, que revezaram o cetro desde 1961. Foi braço-direito de Platini e recebeu seu apoio até não precisar mais dele.
 
Com ternos impecáveis, perfil quase esguio e cabeça raspada, Infantino chegou prometendo o de sempre: modernidade, honestidade, democracia e transparência –além de quadruplicar os repasses para as federações nacionais. Por isso, enquanto no COI, que passava por crise bem menor, a ordem foi reduzir custos em obras olímpicas, na Fifa, o gigantismo não só foi mantido, como turbinado.
 
Mal assumiu, Infantino já anunciou que queria uma Copa com 48 clubes. O formato, que deve começar em 2026, na Copa da América do Norte, sobe o número de jogos de 64 para 80 (+25%). Logo estádios, sedes, voos, diárias, refeições subirão quase na mesma taxa. São mais
gastos e… mais receitas para distribuir.
 
Infantino não ficou só nisso. Propôs uma Liga Mundial de Nações e reformatou o Mundial de Clubes. Diz que um misterioso fundo liderado pelo banco japonês SoftBank pagaria US$ 25 bilhões por dez anos de contrato. Só isso quase triplicaria a receita da Fifa –de US$ 5,7 bilhões no atual quadriênio– que já é o triplo de quatro ciclos atrás.
 
Seu estilo centralizador e seu apetite por dinheiro está assustando até mesmo antigos aliados. Alguns relembram a origem da sua família, o Sul da Itália, lar de três máfias.
 
Na última reunião da Fifa, a resistência interna freou seus planos. Mas as cobranças de suas promessas políticas não param. E no ano que vem precisará disputar a reeleição. Se vencer, pode em tese, ficar indefinidamente. Se Infantino deixar o cargo com a mesma idade de Havelange, 83, vai ficar até 2054. Com os mesmos métodos de hoje.
 
Por isso, nesta Copa, aproveite o futebol. A Fifa não mudou de estilo, só de estilista.

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