Copa do VAR está virando várzea

O VAR, a novidade da Copa, para reduzir os erros de arbitragem e as cenas de reclamação no gramado, está indo bem no primeiro objetivo, mas é um fracasso retumbante e crescente no segundo.

Quem criou o VAR deve ter imaginado um cenário de NFL. Quando é chamado o VAR, os jogadores aguardam pacientemente a revisão e depois festejam ou lamentam o resultado. Nenhum daqueles gigantes, que chegam a pesar 160 kg e medir 2,05 metros de altura, ousa mover um dedo em relação aos homens de boné.

Só que os bacanas da Fifa se esqueceram de dois pontos essenciais: com a novidade, iria cair, como caiu, a tolerância para com os erros –uma coisa é um jogo conduzido por olhos humanos, outra é ter ajuda de dezenas de câmeras–; e a própria cultura do futebol, em que a reclamação não só é muito presente, como vem crescendo.

Profissionais de futebol são de longe os atletas que mais contestam a arbitragem em todo o planeta. Mesmo em esportes em que os bate-bocas entre técnicos e árbitros já foram em alguma época quase uma atração, como o beisebol da MLB, o habito de contestar as marcações não se compara ao futebol.

No esporte da Copa, jogadores, reservas, treinadores, cartolas e até os gandulas tentam tirar uma casquinha do árbitro, sempre que possível.

Para piorar, por aparentes desrespeitos ao protocolo do VAR, foram cometidos erros grosseiros. O principal caso ocorreu na partida entre Sérvia e Suíça, na última sexta-feira. Num cruzamento, o atacante Mitrovic foi agarrado fora ao mesmo tempo por dois suíços, Lichtsteiner e Ljajic, e forçado a ir para o chão, num lance que lembrou mais rúgbi ou futebol americano. Outro lance notório foi um pênalti sobre o inglês Harry Kane diante da Tunísia. Nenhum dos dois foi marcado.

O VAR não foi usado nos lances, e a Fifa até agora ignora o protesto dos sérvios.

E esse não é o único problema. Os árbitros estão sendo aconselhados a não interromper jogadas duvidosas e deixar o VAR resolver depois. Até a marcação de impedimentos estão sendo jogada nas costas do quarteto que fica na salinha.

Com a soma desses fatores, a Copa está virando uma várzea. Nunca houve um Mundial em que os árbitros fossem tão cercados como este. Se, na primeira rodada, os apitadores até conseguiram afastar os jogadores e mostrar autoridade, nos últimos dias, a pressão chegou perto do contato físico.

No jogo entre Portugal e Irã, na última segunda-feira, os ânimos estavam exaltados quase desde o começo. Dedo na cara do árbitro era cena quase comum. Com dois pênaltis e um lance passível de expulsão detectados pelo VAR, as paralisações viravam cenas quase cômicas. A cada parada, os jogadores do time que poderia ser beneficiado buscavam abrir o caminho do juiz até o monitor, enquanto os do outro o cercavam, como crianças diante da mãe, com medo de que ela descobrisse que o vaso da vovó tinha virado caco.

E no final o efeito nem foi tão grande. Dos dois pênaltis, um foi convertido. E a suposta agressão de Cristino Ronaldo a Pouraliganji lhe rendeu um econômico cartão amarelo.

Se essa pressão aconteceu numa partida em que mal e mal estava em disputa uma vaga –o Irã precisava vencer e ficou a maior parte do jogo atrás no marcador–, imagina-se o que pode ocorrer quando chegarem as quartas, semis e final.

A Fifa precisa agir e rápido.

O comando da arbitragem e da Fifa teria uma solução simples para reduzir o problema: punir, com amarelos e vermelhos, todo mundo que se excede. Isso aliás está na regra.

Mas não vai acontecer. Se isso fosse executado, em primeiro lugar um monte de partidas não terminaria. E jogadores, treinadores, cartolas e até jornalistas pressionariam tanto que não seria difícil o próprio presidente da federação ficar ameaçado.

A estratégia da Fifa parece esperar que a situação saia de controle para aplicar suas regras com menos resistência.

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