Agentes ameaçam processar Fifa contra limites em seus ganhos

Durante a Copa da Rússia, a bola (quase) para no mundo, mas não a política da bola. Um grupo de super-agentes de futebol ameaça ir à Corte Européia de Justiça contra a Fifa, caso a entidade baixe uma legislação sobre transferências de atletas tal qual está programando.

O presidente da Fifa, Gianni Infantino, já anunciou que pretende combater o poder econômico dos grandes clubes e agentes, por meio da redução do número de transações e das comissões pagas.

Algumas das mudanças estudadas são o limite de quatro contratações na janela de inverno (mais duas por motivo de lesão grave) e verificação criminal das transferências de dinheiro.

A criação de um grupo para criar as regras foi anunciada em janeiro, após um estudo da Uefa mostrar que nas cinco temporadas até 2016-17 os agentes faturaram 2,5 bilhões de libras (cerca de R$ 12,6 bilhões) em negócios na Europa. O valor é 12% a mais que o orçamento do Manchester United, o clube mais rico do mundo, no mesmo período. Supera também os 20 clubes da Série A do Brasil somados.

Por causa disso, a Uefa determinou que os clubes devem publicar em detalhes os pagamentos de comissão. No Brasil, isso é opcional. Estima-se que menos de 10% dos pagamentos são declarados.

Quando atuam numa negociação, os agentes são remunerados de várias maneiras. As principais são a comissão de intermediação do negócio, recebida do clube vendedor, e a taxa sobre o contrato entre jogador e clube, descontada do atleta.

Em geral as relações entre agentes e jogadores são estáveis e entre clube e intermediário são realizadas caso a caso. Em cada esporte a taxa de intermediação é diferente, segundo sua própria tradição. Na NFL (futebol americano), a liga com a média salarial mais alta do mundo, a comissão é de 2%.

No futebol, ela é bem mais alta. Segundo o estudo, nas transações maiores, ela fica em 9%. Nas pequenas pode chegar a 40%. Na média, fica em 13%. A Fifa queria limitar essa taxa em 3%. Os agentes pressionaram, a proposta subiu para 5%, mas não houve acordo.

Do ponto de vista da representação de atletas, o mercado ainda é muito pulverizado. É muito raro, por exemplo, que um agente tenha mais do que 2 entre os 20 jogadores mais valorizados do mundo.

Quando negociam seus principais jogadores, os agentes podem receber duplamente. Um caso que gerou escândalo foi a comissão de 41 milhões de libras (R$ 206 milhões, pelo câmbio atual) recebida pelo agente italiano Mino Raiola pela transferência do meia Paul Pogba, da Juventus para o Manchester United, em 2016.

O valor dessa comissão equivale, grosso modo, ao orçamento do Fluminense em 2017.

A questão não é o dinheiro em si, mas o poder que ele agrega aos agentes, que são contra as principais mudanças.

O português Jorge Mendes, dono da Gestifute e agente de Cristiano Ronaldo e ex de Felipão, atua não só no mercado de jogadores, como no de clubes, em vários continentes. Para convencer empresários a vender –ou a comprar– clubes, Mendes atua tanto como um financiador, quanto como fornecedor de jogadores para os novos proprietários.

Com a qualidade dos atletas cada vez mais concentrada, o dinheiro do futebol se concentra também.

O reflexo dessa situação está na Copa do Mundo. A cada Mundial, há mais atletas atuando fora do país de origem e mais jogadores atuando por seleções estrangeiras (Na Rússia, 82 em 22 seleções). Como os países periféricos, perdem jogadores cada vez mais cedo, têm mais dificuldade para formar novas gerações e completam a seleção com atletas nascidos em países centrais. Na Copa há 50 nascidos na França, em seis seleções (21 na própria equipe).

Raiola, a Gestifute e o Stellar Group, de Londres, a trinca das maiores agências, têm se reunido com frequência entre si e com Infantino e já o avisaram que, se não forem mais ouvidos, irão à Justiça. A ver.