Após escândalo e com novo presidente, Fifa caminha para o Oriente

O elenco de patrocinadores da Copa da Rússia mostra como a combinação da geopolítica mundial com o chamado Fifagate afastou empresas dos países do antigo “bloco ocidental” (EUA, União Européia, Canadá e Japão, especialmente) da entidade máxima do futebol. E fez a Fifa buscar novos rumos.

Várias empresas ligadas ao Ocidente ou aliados, como Emirados Árabes, saíram. Em seus lugares entraram corporações da Rússia e China e de países com interesses regionais, como o Qatar.

Grande parte das novas empresas estão ligadas apenas a esta Copa, mas algumas são “Fifa Partners”, a categoria top de patrocínio, que se aplica a todas as competições.

Pelos dados da entidade, até 2014 nunca um Fifa Partner havia deixado de renovar contrato. Desta vez, porém, dois saíram: Sony (Japão) e Emirates Airlines (Emirados Árabes). Em seus lugares, entraram Wanda (hotéis e cinemas, China), Gazprom (petróleo, Rússia) e Qatar Airlines. Como a Fifa criara duas vagas, uma ficou vazia.

As que permanecem são Coca-Cola (EUA, parceira desde 1982), Adidas (Alemanha, 1998), Hyundai (Coréia do Sul, 2002) e Visa (EUA, 2010).

Na categoria de patrocinadores da Copa, criada em 2010 (seis slots) e ampliada em 2014 (oito), a mudança foi quase completa. Saíram seis empresas como Castrol (lubrificantes, Reino Unido), Continental (pneus, Alemanha) e Johnson & Johnson (farmacêuticos e higiene, EUA) e entraram só três: Hisensi (TVs), Mengniu (laticínios) e Vivo (celulares), todas chinesas.

Só o McDonald’s (EUA) e a Budweiser (marca americana da belga AB InBev) continuaram.

A mudança de perfil tem duas causas. Com o Fifagate, alguns patrocinadores se afastaram alegando questões éticas. O segundo é a escolha, ainda em 2011, das sedes de duas Copas (Rússia-18 e Qatar-22) em países com problemas nas relações diplomáticas com o Ocidente e aliados.

A Rússia, mesmo após a queda do comunismo, nunca deixou de ser o alvo prioritário da Otan, a organização militar entre EUA e Europa. Em março, o atentado contra um ex-espião russo e sua filha em território britânico, levou o governo de Theresa May a retaliar a Rússia, com o apoio dos aliados. Antes disso, a Rússia não era bem vista pela Europa ocidental. Tanto que de nenhum país do continente partiram muitos torcedores –todos menos até que o Brasil.

O Qatar, por outro lado, busca aumentar sua influência no Oriente Médio, desafiando a liderança da Arábia Saudita, tradicional aliada dos EUA. Em junho, a Arábia Saudita, Egito, Emirados Árabes e Bahrein romperam relações diplomáticas com o Qatar, acusando-o de financiar o terrorismo –alguns desses países, como a Arábia Saudita, também são acusados da mesma coisa por analistas internacionais.

A China, segunda maior economia mundial, e que tenta ocupar espaços abertos pelas práticas protecionistas do presidente dos EUA, Donald Trump, tem no futebol uma das suas prioridades da diplomacia de negócios, o chamado soft power. O Qatar já faz isso há mais tempo, e a Rússia deve seguir os mesmos passos.

Ao mesmo tempo, a Fifa fragilizada pela operação do FBI e pela queda de patrocínios na Copa de 2018, encontra dificuldades não só para estancar seu déficit corrente como para cumprir a promessa eleitoral do presidente Gianni Infantino de quadruplicar os repasses para as federações nacionais.

Por isso, não deve ser surpresa se Infantino começar a se encontrar cada vez mais com políticos de países que nunca fizeram parte do centro do futebol mundial. O cartola sabe que o mundo do futebol é um excelente ambiente para diplomacia e negócios e vai usar isso para consolidar seu poder na Fifa.